O
Gênero Jornalistico
Lívia Nery
Introdução
A categoria dentro
da ciência da comunicação massiva periodística
que se convém chamar gênero jornalístico é
o que trataremos neste trabalho. Dentro dos jornais e revistas, esta
categoria é dividida por José Marques de Melo, correspondendo
à critérios de "intencionalidade dos relatos, levando
em consideração a praxis jornalística; e busca
identificar a natureza estrutural dos relatos"
Dessa forma, vamos tomar como referência a classificação
de Gêneros Jornalísticos proposta por ele .
A) Jornalismo Informativo:
1. Nota 2. Notícia 3. Reportagem 4. Entrevista
B) Jornalismo Opinativo: 5. Editorial 6. Comentário 7. Artigo
8. Resenha 9. Coluna
Partiremos a nossa
análise para a Resenha, e seu formato dentro do gênero
jornalístico opinativo. O gênero jornalístico que
se convencionou chamar de resenha corresponde a uma apreciação
das obras de arte ou dos produtos culturais, com a finalidade de orientar
a ação dos fruidores ou consumidores"
Essa é a definição de resenha para Melo, e ele
ainda diz que o termo no Brasil ainda não se generalizou, se
persiste em dizer crítica a respeito do gênero e crítico
por quem a faz.
Objetivo
O objetivo
principal dessa pesquisa foi o de analisar os conceitos de Resenha e
Crítica contidos em José Marques de Melo, A Opinião
no Jornalismo Brasileiro, e estabelecer uma relação com
as estruturas que compõe os mesmos nas resenhas musicais dos
periódicos e da Internet, para analisa-las em sua prática.
A pesquisa proposta se iniciou com a análise empírica
e identificação destes gêneros - resenhas e críticas
musicais - nas edições publicadas entre 8 e 19 de julho
de 2001 do Caderno 2 do jornal "A Tarde", edições
de 9 a 14 de julho de 2001 do Caderno "Ilustrada" do Jornal
"Folha de São Paulo" e as resenhas críticas
da semana do dia 8 à 14 de julho do site cultural "No".
Critérios
para análise
A definição
das escolhas dentro do tema escolhido se deram a partir dos seguintes
critérios:
1. Tempo: Atualidade e Contextualização
2. Espaço: Formato e estrutura
3. Existência de opinião
4. Linguagem
5. Lugar de fala
6. Periodicidade
Eis os resultados
que nos levaram a escolher os periódicos:
Folha de São Paulo - Caderno Ilustrada musical
1. Tempo: Possui atualidade, discutia álbuns recém-lançados,
aproximando o objeto temporalmente do dia em que foi publicada a resenha.
2. Espaço: As resenhas possuem o título "Crítica",
e estão posicionadas logo depois de uma matéria informava
sobre o lançamento do CD, ou depois de entrevista ou reportagem
sobre o artista de que fala a resenha.
3. Opinião: Existente clara valoração com relação
aos bens culturais de que escrevem.
4. Linguagem: Uso de adjetivos qualificadores em maior quantidade do
que em outros textos jornalísticos
5. Lugar de fala: A autoria é definida. Os que escrevem têm
seu lugar de fala no jornal.
6. Periodicidade: Gira em torno do bem cultural, não tem dia
determinado para ser publicada
A TARDE - Caderno 2 - Coluna Pop
1. Tempo: Possui atualidade, discutia álbuns recém-lançados,
aproximando o objeto temporalmente do dia em que foi publicada a resenha.
2. Espaço: Uma coluna fixa, no canto esquerdo da página
5 do caderno, cujo título é "Pop".
3. Opinião: Existente clara posição de opinião
com relação aos bens culturais de que escrevem.
4. Linguagem: Uso de adjetivos qualificadores em maior quantidade do
que em outros textos jornalísticos
5. Lugar de fala: A autoria é definida. Os que escrevem têm
seu lugar de fala no jornal
6. Periodicidade: Todas as quintas-feiras da semana
Site NO - link Babel - colunistas
1. Tempo: Possui atualidade, discute álbuns recém-lançados,
aproximando o objeto temporalmente do dia em que foi publicada a resenha.
2. Espaço: Espaço virtual, não há diferenciação
para outros textos.
3. Opinião: Existente clara posição de opinião
com relação aos bens culturais de que escrevem.
4. Linguagem: Uso de adjetivos qualificadores em maior quantidade do
que em outros textos jornalísticos
5. Lugar de fala: A autoria é definida. Os que escrevem têm
seu lugar de fala no jornal
6. Periodicidade: Atualização segundo os lançamento
do mercado cultural.
Proposta para análise
O fato de haver
pouca produção sobre gêneros opinativos, especificamente
resenha e crítica que tenha uma proposta consistente, nos leva
a basear nossas análises no capítulo do livro de José
Marques de Melo, Classificações Brasileiras. , que pode
ser considerado completo.
Melo define como resenha "uma apreciação das obras
de arte ou dos produtos culturais com a finalidade de orientar a ação
dos fruidores ou consumidores" e insiste em diferencia-la da crítica,
termo que persiste nos jornais brasileiros.
Para entender a diferenciação, o autor nos remete à
transição do jornalismo brasileiro da "fase amadorística"
, à "fase profissionalizante" . Essa transição
se dá com o advento da Indústria Cultural, cujos produtos
- os bens culturais - necessitavam de uma orientação para
consumo. Antes, segundo Melo, os jornais cediam espaço para a
análise estética no campo da literatura música,
teatro e artes plásticas feitas pelos intelectuais. Veja o quadro
abaixo, baseado nos dados de Melo:
Fase amadorística
Fase profissionalizante
Análise estética no campo da literatura, música,
artes plásticas, teatro (obras de arte) Análise de novos
produtos da indústria cultural
Exercício feito por intelectuais, apenas, sem regularidade Não
necessariamente feito por intelectuais, geralmente não, feito
regularmente
Exercício eventualmente remunerado Atividades remuneradas
Apreciação da própria obra de arte, apreende o
sentido profundo das obras Não entra na essencia das obras quanto
bem cultural, destinada a orientação ao consumo de grandes
contingentes
Destinada a uma parcela restrita da população (elites)
Público leitor mais amplo, classe média e setores do operariado
Utiliza-se da crítica Utiliza-se de resenhas
Crítica feita em profundidade, matérias bem elaboradas
Resenhas conjunturalmente despojadas,, adquirindo simplicidade
Jornalismo de pequena escala (antes dos 30) Jornalismo de escala industrial
(depois dos 30)
Padrões estéticos refinados Padrões populares
É a partir
transformação que se convencionou chamar de resenha o
que antes era crítica. Afrânio Coutinho diz:
A resenha (antigamente
chamada de rodapé literário), é atividade propriamente
jornalística que se caracteriza por ser um 'comentário
breve', quase sempre permanecendo 'às margens' da obra ou não
saindo do 'a propósito'..., dirige-se ao 'consumo popular'.
Melo acrescenta
dizendo que "não é de se estranhar que a resenha
prolifere nos meios de comunicação coletiva" . Para
ele não cabe à crítica "o exercício
periódico e regular em jornal" , ou "o próprio
espírito do jornal, que é informação ocasional
e leve" . O que se faz no jornalismo brasileiro de hoje, então,
segundo o autor é resenha, e às críticas restaram
os suplementos culturais, revistas especializadas, livros e "teses
universitárias" . Ele ainda diz:
a resenha não
tem a intenção de oferecer julgamento estético,
mas de fazer uma apreciação ligeira, sem entrar na sua
essência [do produto apreciado] como bem cultural..., configura-se
então como um gênero jornalístico destinado a orientar
o público na escolha dos produtos culturais em circulação
do mercado..., havendo muitas opções no mercado cultural,
o consumidor quer dispor de informações e juízo
de valor que o ajudem a tomar a decisão de compra.
O objetivo deste
trabalho é verificar se o que se configura como resenha para
José Marques de Melo é de fato representado na prática
de jornais brasileiros. Fizemos uma análise sobre o material
colhido e constatamos ser preeminente resenha o que se faz no Brasil,
e não crítica, conforme diz o autor. Segundo os seguintes
critérios ditos anteriormente por Melo, podemos dizer que pelas
seguintes razões a resenha se diferencia de crítica:
1. Comentário
curto, apreciação ligeira
2. Não entra profundamente na essência do bem cultural
3. Orienta no consumo do bem
4. Segue padrões da comunidade (populares)
5. Produzidos muitas vezes por gente sem qualificação
Comparando-os ao
material colhido e fazendo uma análise geral de cada veículo
chegou-se a:
Site No
1. Comentário não tão breve
2. Entra um pouco na essência do bem cultural.
3. Segue padrões que nem todos entenderiam
4. Orienta no consumo na medida em que comenta um produto cultural à
venda - CD. Não o faz explicitamente
5. Feito por jornalistas que possuem argumentação para
o que dizem.
A Tarde - Caderno 2
1. Comentário breve
2. Não entra profundamente na essência do bem cultural
3. Segue os padrões de linguagem populares
4. Orienta no consumo na medida em que comenta um produto cultural à
venda - CD. Não o faz explicitamente
5. Produzido por colunista sem qualificação, que não
fundamenta a opinião
Folha de São
Paulo - Ilustrada
1. Comentário breve
2. Não entra na essência do bem cultural, porém
fundamenta suas opiniões
3. Segue padrões de linguagem que não seriam entendidos
por todos que lessem o jornal
4. Orienta no consumo na medida em que comenta um produto cultural à
venda - CD. O faz explicitamente através das cotações
5. Feito por jornalistas que possuem argumentação para
o que dizem
Da definição
feita por Melo, é importante fazer uma consideração
à respeito do seu ponto de vista sobre os grandes contigentes
à quem se dirigem as resenhas. Melo diz que por passar a ser
direcionada a classe média e setores operariados, a resenha toma
uma valoração negativa, deixando transparecer um certo
caráter elitista em seu discurso. Como se só o que é
feito para as elites, com caráter refinado, tem valor no seu
discurso. Para nós a resenha ser feita para um público
também popular não retira dela o caráter positivo.
Pode haver críticas muito bem embasadas e bem feitas, mesmo falando
de cultura popular para um público popular.
A resenha também não só orienta para compra, como
muitas vezes o autor ressaltou em seu texto. Nos exemplos vistos não
se sobressai a função de orientar para a compra. Primeiramente
ela "informa, proporcionando conhecimento sobre o que está
em circulação no mercado cultural e sobre a natureza e
a qualidade das obras comercializadas...despertando muitas vezes o senso
crítico para sua fruição".
Fraser Bond e Todd Hunt são citados por Melo com diferentes classificações
para as resenhas, dividindo-as basicamente em um modelo que é
feito resgatando aspectos anteriores ao bem cultural e que descreve
sumariando - a clássica ou histórica - e outro que considera
a impressão do 'crítico' - impressionista ou conjuntural.
Nós achamos que esta divisão a rigor não existe.
Nos nossos estudos sobre resenha não se viu nenhuma que contesse
somente um aspecto ou outro, eles vêm combinados, como admite
Hunt fazendo uma espécie de roteiro da estrutura narrativa da
resenha, que vai se mostrar quase totalmente diferente do modelo proposto
por nós.
1) Breve análise
de precedentes, situando a obra em questão dentro de um determinado
contexto, seja histórico, estético ou político;
aí, o crítico enuncia o quadro referencial que o orienta.
2) Apreciação da obra, destacando suas virtudes, suas
falhas 3) Conclusão, afirmando por que gostou da obra ou não
gostou.
Coutinho, em Melo,
indicou uma estrutura de resenha brasileira baseado em Humberto de Campos,
que se aproxima mais da nossa análise com o material colhido,
mas ainda peca por ser muito fragmentária.
a) um nariz de cera
como introdução acerca do assunto da obra; b) Algumas
notas sobre o autor e sua produção anterior; c)Mais algumas
digressões e anedotas; d) Afinal, um juízo pessoal de
acordo com o critério de gosto e sensibilidade do crítico.
"Nariz de cera",
"anedotas", exprimem o caráter irônico com que
Coutinho se refere à resenha brasileira, como se fosse feita
sem nenhum compromisso além de divertir e 'enrolar'.
Com base no modelo proposto por Hunt e Coutinho, analisaremos as o nosso
material de pesquisa para tentar chegar à uma sumarização
de um esquema para a resenha brasileira.
Site No
1) Introdução ao Cd
2) Apresentação de comparações e referências
à álbuns ou bandas passadas
3) Descrição mais minuciosa feita por faixa do Cd
4) Fechamento feito com a reafirmação da opinião
defendida
* A resenha se constitui opinativa em todas as etapas
A TARDE - Caderno 2
1) Longo histórico da banda ou artista sem opinião emitida
2) Breve introdução ao CD com opinião
3) Descreve as faixas sem opinar
Finaliza sem fundamentar o porque da opinião inicial.
Folha de São Paulo - Ilustrada
1) Introdução do CD ou Breve Histórico do artista
2) Opinião e argumentação faixa por faixa
3) Fechamento reafirmando a opinião
De acordo com o
resultado podemos sumarizar o seguinte esquema: O início das
resenhas, quase por unanimidade introduzem o produto cultural, que em
todos os casos analisados foi um CD. O breve histórico vem em
seguida, podendo conter também uma comparação.
A apreciação com emissão de opinião acontece
durante toda a resenha, na maioria dos casos, sendo que o autor emite
sua opinião e a desenvolve fundamentando com elementos da própria
obra comentada. A maioria também possui um fechamento, reafirmando
o valor que se deu aos mesmos.
Um tema bem abordado por Melo em sua obra é a discussão
que gira em torno do exercício do que no país se convém
chamar crítica feito por pessoas "muitas vezes sem qualificação,
pois vigora [na produção de resenhas] a 'lei do mais forte'
ou do 'quem chega primeiro' " . Ele diz:
No Jornalismo
europeu e norte americano as resenhas são produzidas por intelectuais
que combinam a argúcia jornalística com o conhecimento
do setor cultural que criticam... são portanto pessoas medianas,
que nem se caracterizam como ignorantes da área analisada, nem
tampouco vivem numa torre de marfim, desconhecendo a sensibilidade do
público e procurando entender as produções apreciadas
num contexto mais amplo, são jornalistas que procuram explicar,
esclarecer, orientar o público no contato com as produções
de um segmento da industrial cultural.
Já
Coutinho aponta os críticos brasileiros como "jornalistas
que se improvisaram e se converteram rapidamente em juizes, ou então,
frustrados que buscaram abrigo nos meios de comunicação
para criticar com veemência os que obtiveram êxito na produção
cultural."
Bem, para comprovar o que diz Coutinho, seria preciso uma pesquisa de
campo muito mais rica em diferentes tipos de dados do que a realizada
neste trabalho. É difícil, com uma amostra não
tão rica de exemplos, identificar o que leva os críticos
a escreverem.
É possível confirmar, porém, que os críticos
que hoje escrevem resenhas para jornais não são especialistas
no assunto. Com um exemplo mais específico, o do Jornal A Tarde,
com o Caderno 2 seção musical "Pop", é
possível dizer mais. Neste caso, não só a crítica
é feira por um "crítico" sem especialidade no
assunto, como ela é de má qualidade. Na crítica
falta esclarecimento, argumentação e fundamentação
para ao menos orientar o público com o bem cultural apresentado.
Conclusão
Neste trabalho,
através da leitura de José Marques de Melo, e em comparação
com a pesquisa empírica, pode se chegar às seguintes conclusões:
que o que se faz no Jornalismo brasileiro é resenha e não
crítica, porém não de uma forma tão determinada
pela orientação ao consumo, como diz Melo. Ainda confirmamos
através do exemplo da "Folha de São Paulo",
que o jornal insiste em usar a denominação de crítica
à resenha , conforme disse Melo.
A respeito de um roteiro para a crítica, nossa pesquisa apontou
um, diferente do que Melo cita em sua obra, retirado de Coutinho. Porém
não possível com o grau de diferenças de resenhas
no Brasil, se propor um modelo de resenha que seja seguido por todos
os resenhistas.
Sobre a discussão de que quem faz a resenha são pessoas
desqualificadas, nós provamos que elas não são
especializadas em música, porém dentro do que propõe
escrever podem ou não o fazerem de forma competente. Vai depender
aí, do grau de argumentação de que se utilizam
para fundamentar suas opiniões.
Acreditamos que o que Melo diz sobre a mudança na característica
de fazer crítica, passando-se para resenha por causa da necessidade
da indústria cultural, seja realmente válida. Porém
não há na resenha a característica única
e marcante de orientar o leitor na compra ou não do produto.
A resenha antes de tudo expõe o ponto de vista de um "crítico"
, mas o leitor tem seus pontos de vista também, e com relação
a determinados críticos ou estilos musicais, inclusive.